LEILA FERREIRA
Estamos obcecados com "o
melhor". Não sei quando foi que começou essa mania, mas hoje só queremos
saber do "melhor". Tem que ser o melhor computador, o melhor carro, o
melhor emprego, a melhor dieta, a melhor operadora de celular, o melhor tênis,
o melhor vinho Bom não basta.
O ideal é ter o top de linha, aquele
que deixa os outros pra trás e que nos distingue, nos faz sentir importantes,
porque, afinal, estamos com "o melhor". Isso até que outro
"melhor" apareça e é uma questão de dias ou de horas até isso
acontecer.
Novas marcas surgem a todo instante.
Novas possibilidades também. E o que era
melhor, de repente, nos parece superado, modesto, aquém do que podemos ter.
O que acontece, quando só queremos o
melhor, é que passamos a viver inquietos, numa espécie de insatisfação
permanente, num eterno desassossego.
Não desfrutamos do que temos ou
conquistamos, porque estamos de olho no que falta conquistar ou ter. Cada
comercial na TV nos convence de que merecemos ter mais do que temos. Cada
artigo que lemos nos faz imaginar que os outros (ah, os outros...) estão
vivendo melhor, comprando melhor, amando melhor, ganhando melhores salários. Aí
a gente não relaxa, porque tem que correr atrás, de preferência com o melhor
tênis.
Não que a gente deva se acomodar ou
se contentar sempre com menos. Mas o menos, às vezes, é mais do que suficiente.
Se não dirijo a 140, preciso realmente
de um carro com tanta potência? Se gosto
do que faço no meu trabalho, tenho que subir na empresa e assumir o cargo de
chefia que vai me matar de estresse porque é o melhor cargo da empresa? E aquela TV de não sei quantas polegadas que
acabou com o espaço do meu quarto? O restaurante onde sinto saudades da comida
de casa e vou porque tem o "melhor chef"? Aquele xampu que usei
durante anos tem que ser aposentado porque agora existe um melhor e dez vezes
mais caro? O cabeleireiro do meu bairro
tem mesmo que ser trocado pelo "melhor cabeleireiro"?
Tenho pensado no quanto essa busca
permanente do melhor tem nos deixados ansiosos e nos impedido de desfrutar o
"bom" que já temos. A casa que é pequena, mas nos acolhe. O emprego
que não paga tão bem, mas nos enche de alegria. A TV que está velha, mas nunca
deu defeito. O homem que tem defeitos (como nós), mas nos faz mais felizes do
que os homens "perfeitos". As férias que não vão ser na Europa,
porque o dinheiro não deu, mas vai me dar à chance de estar perto de quem
amo... O rosto que já não é jovem, mas
carrega as marcas das histórias que me constituem. O corpo que já não é mais
jovem, mas está vivo e sente prazer.
Será que a gente precisa mesmo de
mais do que isso? Ou será que isso já é o melhor e na busca do
"melhor" a gente nem percebeu?
"Sofremos demais pelo pouco que
nos falta e alegramo-nos pouco pelo muito que temos." (Shakespeare)
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Leila Ferreira é uma jornalista
mineira com mestrado em Letras e doutora em comunicação em Londres. Apesar
disso, optou por viver uma vidinha mais simples, em Belo Horizonte.
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